terça-feira, 4 de março de 2008

Sonho interrompido

Andava cabisbaixo pelas calçadas. As pessoas que cruzavam o olhavam com desaprovação, como se ele fosse culpado da situação em que se encontrava. Estava sujo e faminto. Usava suas últimas forças em busca de alimento, bisbilhotando as lixeiras, ávido por migalhas.

Desde cedo vivia nessa situação, quando foi abandonado pela mãe. As ruas eram a sua moradia, e nelas ele aprendeu a se sustentar. Não almejava muito, mas precisava lutar constantemente para conseguir o mínimo para sua sobrevivência. E com 18 anos já se sentia cansado. As pernas fraquejavam, e ele já não enxergava bem.

O movimento de São Paulo sempre foi ameaçador, apesar de que ele nunca teve uma dimensão do tamanho da cidade. Passeava pelos bairros e passava cada noite em um lugar diferente. Já havia se acostumado com os olhares de asco. Ser nômade fazia parte do seu instinto.

Sem saber, já havia percorrido quase toda a capital, e muitas vezes escapado do perigo. Perambulava pelos limites da cidade, por onde residia a população marginal, quando, pela primeira vez, levantou a cabeça e vislumbrou um novo horizonte, um local inexplorado. Sem titubear, correu em direção à sua sorte, mas num súbito baque, tudo escureceu, e seu sonho se esvaiu.

Quatro horas depois, o caminhão do Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo recolhia o corpo de mais um cão atropelado na Marginal Tietê.

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